sexta-feira, 7 de junho de 2013

Acabou-se a MAGIA

Pablo César Aimar Giordano foi um dos maiores jogadores que tive o prazer de ver jogar com o Manto Sagrado. No restrito clube de génios só Valdo, Rui Costa e João Vieira Pinto me encheram as medidas como o Pablito.

De Aimar disse um dia Diego Armando Maradona (o melhor de sempre): «é o único jogador por quem pagaria o bilhete só para o ver jogar». A admiração por Pablo Aimar não se esgota no seu virtuosismo técnico, além do "monstro" de jogador, era um profissional exemplar. Fustigado por lesões, não atingiu tudo o que o seu potencial augurava, tivesse a "sorte" das lesões não o molestarem e teria sido, várias vezes, indigitado para uma Bola de Ouro.

Valdano (das pessoas que melhor escreve sobre futebol no Mundo!) sintetizou assim: «Aimar es un jugador de dibujitos animados, de fantasia (...) com una sensibilidade futbolistica extraordinária y un talento exquisito», mas acaba dizendo que jogar com continuidade é um registo supremo, não podes ser o melhor do Mundo se de 4 em 4 meses estás lesionado ou na fisioterapia.

Pego precisamente noutra citação soberba de Valdano (Ganar queremos todos, pero solo los medíocres no aspiran a la belleza) para associar Aimar à ideia do futebol bonito, da nota artística. Os génios são, não raras vezes, incompreendidos e por vezes faltaram companheiros ao futebol de luxo de Pablo Aimar. Não é novidade para ninguém que foi Javier Saviola (outro craque) quem melhor percebeu o futebol do Mago argentino. E a verdade é que as combinações entre os dois raramente tinham defesa, porque quando duas mentes pensam o mesmo e o executam sem falar...estamos muito próximos da beleza máxima do futebol.

O argentino, apesar de raçudo e extremamente competitivo, tem uma debilidade com a gambeta (drible) e sobretudo com o caño (cueca/túnel), basta recordar as palavras de Maradona após a sua estreia na 1ª divisão argentina (a 10 dias de fazer 16 anos): «perdimos pero hice un caño». Cabrera, o jogador que "sofreu" o primeiro túnel de Maradona na 1ª divisão ficou famoso por isso mesmo, e apesar da derrota, Dieguito estava eufórico com o caño e disse que naquele dia começou a tocar o Céu. Esta simples história é bem exemplificativa de como os argentinos adoram a arte, a tal "belleza" do futebol que falava Valdano.

E só a título de curiosidade, na última chamada de Aimar à Selecção Argentina (treinada então por...Maradona), num treino onde o Mago defrontava os presumíveis titulares, foi um caño deste a Fernando Gago que fez o Pelusa gritar: «Caños No!!» Talvez a mudança radical daquele pibe de 15 anos para o treinador explique alguma coisa nos fracos resultados da albiceleste, ou então demonstre que um treinador não pode perder a fantasia dos tempos de jogador em virtude do resultadismo...

Entre as imagens míticas de Aimar com o Manto Sagrado há também um caño, a Andrea Pirlo do AC Milan (eu não sou argentino, mas confesso que é o gesto técnico que mais me agrada no futebol, e apesar de parecer simples, tem toda uma arte na sua execução) numa edição da Eusébio Cup; há aquele passe de rabona a isolar Suazo para um golaço em Guimarães; o golo na Luz frente ao Paços onde recebe a bola no nosso meio-campo e dribla, sozinho, meia equipa adversária antes de rematar colocado para o fundo das redes; o golo do derby, onde deita Rui Patrício e, debaixo de chuva e com pouco ângulo, coloca a bola, com classe à Aimar, na baliza adversária; a delicatessen frente ao V.Setúbal numa noite gloriosa de golos; e sobretudo o beijo ao escudo benfiquista naquela noite dos 4-1 ao PSV, é precisamente aquele frame de raiva, orgulho e delírio que guardo como A imagem de Aimar.

Costumo dizer que para se apreciar Aimar não bastam vídeos de youtube, é preciso ver um jogo dele ao vivo, apreciar tudo o que representava El Mago. Pablito nunca foi um portento físico, sempre foi um jogador franzino, mas aprendeu a contornar esse handicap no futebol de alta competição com um controlo de bola, uma técnica refinada para esconder o esférico do adversário, que lhe proporcionava poucas perdas de bola no despique directo e muitas faltas sofridas. Depois eram as mudanças de velocidade que eram sublimes. Se no Benfica não tivemos a velocidade do pibe do River e dos primeiros anos de Valencia, continuámos a assistir àquelas mudanças de velocidade que ultrapassavam adversários atrás de adversários. E essa sempre foi uma marca registada do futebol de Aimar. Isso e a capacidade de assistir os companheiros, de os deixar na cara do golo. A visão de jogo, o critério no passe, o "inventar" linhas de passe eram tudo atributos do génio de Aimar, apetece-me dizer que jogar com Aimar é fácil e que quem joga com ele torna-se melhor futebolista.

Foi um orgulho imenso ver um jogador da craveira de Pablo Aimar no Benfica - o ídolo de Lionel Messi - foram 5 épocas que souberam a pouco mas que o tornaram Imortal no meu coração. Gostava de escrever algo mais que OBRIGADO PABLITO, mas acabo com uma citação daquele que um dia o argentino apelidou de «melhor treinador que já tive»:

O Aimar é um génio para quem aprecia o futebol como arte. O futebol tem duas componentes, que são a científica e a arte, e o Aimar tem arte e tem paixão. - Jorge Jesus

2 comentários:

Joan Carles disse...

Concordo com tudo. E levo vendo a Aimar desde seu primeiro jogo no Valencia. Também destaco sua mudança de ritmo, sua capacidade de decisão, sua visão do jogo -sempre tem visto a jogada cinco segundos dantes de que passe-, seu imenso arsenal técnico

Só uma discrepância: é uma lenda que Aimar tenha dito alguma vez que JJ foi o melhor treinador que teve. E em sua despedida nem nomeou-lhe. Pablo sempre tem dito que o melhor treinador tem sido Marcelo Biel

Tyler Durden disse...

Joan, reza a lenda, que no final do Hapoel 3-0 Benfica, ainda nas cabines, Aimar terá dito a JJ «você é o melhor técnico que tive, mas podia ser muito melhor se lidasse com os jogadores de outra forma».

Pode ser mito, mas essas palavras foram reproduzidas mais que uma vez na imprensa. E sei do carinho que ele tem pelo "loco" Bielsa, e, também notei que não tenha mencionado JJ na despedida...

Mas o importante aqui é mesmo tentar mostrar um pouco daquilo Pablo Aimar foi (e é) no futebol mundial. Ele trazia mesmo magia nas botas e era isso que o tornava diferente, é daqueles jogadores que te ensina algo só de o veres "pisar la cancha".

E é verdade, Aimar fazia a jogada na sua mente, segundos antes de a executar no terreno.

Abraço.